É difícil falarmos sobre nossa relação com o trabalho sem cair nos clichês da pandemia da COVID-19. Essa relação já antes muito estudada e discutida foi totalmente afetada, de uma forma sem precedentes.
A sensação generalizada é que estamos mais sobrecarregados e que as 24 horas do dia não são mais suficientes. Se o trabalho é presencial, a reclamação é do tempo gasto com deslocamento. Se o trabalho é realizado em casa a reclamação passa pelas muitas horas em tela combinadas com os chamados da vida doméstica. O fato é que achávamos que não tínhamos tempo, e hoje o cenário piorou bastante. Estamos em busca de formas de conseguir dar conta dos compromissos mantendo a saúde mental.
Na Veropequi Gente e Cultura todos os sentidos são voltados a entender as relações que nós, pessoas, estabelecemos com o trabalho e o ambiente em que estas relações se desenvolvem.
Aqui, temos um ponto importante a ser tratado: nessa jornada, já vimos muita coisa. Não ousamos dizer que já vimos de tudo. Temos consciência de que nunca veremos.
Ao longo de nossas carreiras e atualmente de maneira bastante aumentada vemos pessoas que estão desenvolvendo ou já desenvolveram doenças ligadas ao trabalho: lesões na coluna, enxaqueca, fibromialgia, burn out, síndrome do pânico… A lista é longa. No café ou no happy hour podemos facilmente presenciar uma conversa sobre remédios para dormir ou remédios para acordar. E o que já parece grave o suficiente fica mais impressionante quando o tema é encarado como uma competição. Ganha quem estiver mais encrencado.
Na sociedade da performance descansamos para poder produzir mais. Nos exercitamos não pela saúde ou pela brincadeira e sim para estarmos bem e com disposição para trabalhar. Se não estamos cansados, a sensação é de que não estamos trabalhando o suficiente.
Não é exagero dizermos que vivemos um colapso mental: sintomas de ansiedade e depressão afetaram 47,3% dos trabalhadores ao longo da pandemia (Fiocruz). Como podemos pensar em formas de cura estando dentro destes ambientes que adoeceram tantas pessoas?
Temos conversado muito sobre formas de sermos menos emocionais no trabalho. Menos intensos, menos apaixonados, menos “família”. Como chegar ao ponto ideal: entregar o que precisa ser entregue, crescer profissionalmente e se autorrealizar?
Construir relações mais saudáveis e criar espaços de confiança são cruciais. Preocupação em construir uma carreira sólida também. Autoconhecimento. Lucidez. Senso de progresso.
Consumir arte, alimentar a espiritualidade, fazer esportes e estar com a família nos nutrem e compõem diferentes formas de realização. Seguimos com uma lista de atividades extensa e complexa de como manter a saúde mental, com o detalhe de que viver histórias cotidianas e conviver em ambientes diversos ao corporativo pode ajudar a equilibrar as expectativas da relação com a empresa, ao gestor, salário ou com os times.
Agir com mais intenção e consciência na corrida pela alta performance e não repetirmos de forma descuidada discursos de apego ou glamourização do cansaço pode nos ajudar a repensar nossas relações com o trabalho e seu sentido nas nossas vidas. Que nosso ofício possa nos trazer prosperidade, desenvolvimento e realização – o lado mais bonito e frutífero dessa relação.
Marina Scatena de Baptista, sócia de Veropequi Gente e Cultura